GULLAR, Ferreira. Ei, pessoal. IN: Toda poesia (1950-1999). 10ed., Rio de Janeiro, José Olympio, 2001. p.208
Água doce na sombra:
Rio azul
(era chamado assim pelo povo do Anil)
sombra de vozes claras
(no
ar? no arfar
do coração?)
sombra de flor azul no paladar
sombra de flor
sombra de sombra
sombra de sombra de penumbra
A fábrica apitava às 11 horas
por cima do capinzal
As máquinas paravam de repente
sobre flores de chita
ainda incompletas
(Marlene se matou
por um vestido?)
A fábrica apitava às 11 horas
sobre flores abertas
sobre a água
sobre risos que riam
dentro d'água
As máquinas paravam de repente
sobre a vida
Onde anda você, Maria Lúcia?
Esmagado, Maninho, Raimundinho?
Onde andam vocês, Adi, Dodô?
A garagem a quitanda os oitizeiros
onde andam vocês
se há muitos anos derrubaram o quartel?
se há muitos anos
destruíram Hiroxima, a Gestapo
a Gespapo
e o poeta jogou-se da amurada
onde a gente brincava?
Onde andam vocês
agora
debaixo desta chuva?
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