"Pesquisador da Casa Rui Barbosa, que vendia cocada na rua, diz que biblioteca pode mudar vida." Deixe a Biblioteca e os livros ajudarem em seu caminho também. Você vai sentir seus olhos abrirem para coisas não antes imaginadas.
Mariana
Menezes - MinC
Cristian
Santos, servidor público da Câmara dos Deputados
e
pesquisador da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB).
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Formado
em Biblioteconomia, Letras Francês, Letras Tradução Francês,
Filosofia e Teologia e fluente em oito línguas, Cristian Santos,
servidor público da Câmara dos Deputados e pesquisador da Fundação
Casa de Rui Barbosa (FCRB), acaba de receber um dos mais importantes
prêmios literários da América Latina, o Casa de las Américas, na
categoria literatura brasileira. Cristian foi premiado com o livro
Devotos e devassos - Representação dos padres e beatas na
literatura anticlerical brasileira, resultado da tese de mestrado
feita pelo pesquisador na Universidade de Brasília (UnB)..
O
livro premiado traça um panorama da representação de personagens
religiosos em três livros da segunda metade do século XIX
considerados anticlericais: O Mulato e O Homem, de Aluísio Azevedo,
e Morbus: Romance Patológico, de Farias Neves Sobrinho.
Segundo
Cristian, a literatura e as bibliotecas o salvaram de uma condição
de muita vulnerabilidade social. O brasiliense vendeu cocada dos nove
aos 19 anos para comprar livros, materiais escolares, passagem de
ônibus e ajudar em casa. Filho de pai carpinteiro e mãe empregada
doméstica, o escritor viu nos livros uma oportunidade de mudar sua
história.
Atualmente,
o servidor público faz pós-doutorado na Fundação Casa de Rui
Barbosa, órgão vinculado ao Ministério da Cultura (MinC), e é
orientado pela pesquisadora Isabel Lustosa. O foco de pesquisa
verificar charges anticlericais que foram publicadas na imprensa
brasileira no século XIX. As charges foram produzidas por jornais
republicanos que defendiam a separação do estado e da igreja na
mesma época dos romances analisados no livro.
Em
entrevista ao MinC, Cristian conta mais sobre a importância do
prêmio e o poder de mudança do livro e da biblioteca, entre outros
temas.
Qual
é a importância de receber um prêmio como este?
O
prêmio é outorgado anualmente pela Casa de Las Américas, em
Havana, capital de Cuba. É considerado um dos prêmios mais
importantes de toda a América Latina e começou em 1960. Tem
diversas categorias, como contos, teatros e, desde 1980, a categoria
literatura brasileira foi incorporada. Em 2016, os textos indicados
deveriam ser não ficcionais de críticas literárias. Era única
categoria aberta para brasileiros. Além de receber o valor de 3 mil
dólares em prêmio, a Casa de Las Américas irá traduzir o livro
para o espanhol. A primeira edição em português teve uma tiragem
de mil exemplares. Agora serão 10 mil.
Como
é sua relação com a leitura?
Eu
vim de uma família muito pobre e sempre fui muito apaixonado pela
biblioteca perto da minha casa. Ali, eu me sentia igual a todo mundo,
era um ambiente democrático e com um lindo jardim. Durante toda a
minha infância e juventude, eu frequentei o espaço. Foi lá que
nasceu o afeto pela literatura, tinha facilidade em localizar as
fontes e quando tinha gincana na escola eu sabia onde tinha cada
informação nos livros.
Como
foi a sua carreira profissional e acadêmica?
Trabalhei
por 10 anos na biblioteca do Superior Tribunal de Justiça.
Posteriormente, passei no concurso da Câmara dos Deputados, onde
estou até agora. Meu mestrado foi em ciência da informação, sobre
os arquivos que existiam antes do final do regime do padroado até
1890. Naquela época, todos os registros eram feitos na Igreja, como
nome, casamento e óbito. Só depois dessa separação que o Estado
começou a produzir seus próprios documentos. Minha análise foi
para saber a condição desses arquivos, que são importantes para a
nossa história e ficaram aos cuidados da Igreja Católica.
Você
tem prêmios no currículo. Quais são?
Fiz
mestrado e doutorado na Universidade de Brasília. Meu mestrado,
defendido em 2005, foi premiado pelo governo da Argentina no concurso
latino-americano Fernando Baiz. O doutorado resultou neste meu livro,
que foi indicado ao Prêmio Jabuti nas categorias capa e crítica
literária. Agora veio o prêmio da Casa de Las Américas.
Pela
sua história, como você vê o papel da literatura na sua vida e na
vida das pessoas?
Os meus pais sempre fomentaram para que eu
estudasse. Eles diziam que a única oportunidade de sair daquela
situação era com o estudo e eu encontrei isso na figura da
biblioteca. Nos últimos anos, o Brasil passou a oferecer uma série
de modalidades de incentivo ao estudo para os mais pobres. Eu não
tive essa oportunidade, mas minha irmã mais nova está fazendo
faculdade por causa desses incentivos. Eu usei da minha cara de pau
para conseguir estudar, entregava cartas manuscritas nas escolas de
línguas para conseguir bolsa. Uma história curiosa foi quando fui
ao Instituto Cervantes falar com o diretor e ele me tratou muito mal,
ele estava com vários problemas na escola. Decidi guardar a carta e
no ano seguinte voltei e consegui a bolsa. Eu reconheço, eu provei
que a biblioteca tem um papel mobilizador e pode transformar a vida
das pessoas. É um espaço que garante que todos os grupos sejam
valorizados.
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